
Examinada a bagaxem, trouxeram-me um automóvel. Os dous homes despediram-se e dirixi-me à cidade em companhia de um rapaz silencioso, que nos deixou no hotel Alcron, onde estavam aloxados vários brasileiros: Jorge Amado, Chermont, Rui, Costa Neto, alguns operários, entre êles Augusto, meu hóspede no Rio. Entrara-me em casa anos atrás, sem dar o nome, ficara unha semana, pesado, macambúzio, o ôlho duro, unha ruga na testa. Sumira-se, reaparecéra com freqüência. Non se metia nas conversas, parecia um roceiro tosco, isento de opinións. Unha noite em que minhas filhas se atarefavam no inglês e no francês para exames no dia seguinte, o home soturno mexera-se, elevando um pouco a voz grossa, baixa, sacudida: -“Posso axudar vocês?” A áspera amabilidade me surprehendera. No salón do Alcron, bebendo com Jorge Amado cálices de óptima aguardente de ameixa, notei que Augusto se fazia entender com facilidade em russo e espanhol. Ivan Riabov apareceu, levou os nossos documentos, iniciando os exames demorados que em breve se tornariam a dança dos passaportes. -Senhor Fulano, o senhor aqui? Voltei-me. Era Zdenka, minha excelente amiga, conhecida anos atrás na Legaçón da Checoslováquia, no Rio. A figurinha encantadora, mocidade forte, envolveu-me nunha onda de recordaçóns amáveis. Lembrei-me de um telegrama de felicitaçóns que ela me enviara polo Natal: como tinha um nome de pronúncia terríbel, assinara-se “Zdenka da Legaçón”. Pedi notícias de Pitha, de Consuelo e de Blasta. Blasta andava ali perto e xá tinha descoberto minha mulher. Depois de longas hesitaçóns, o sol tinha resolvido sumir-se. As minhas amigas saíram, prometendo voltar. Marchámos para o restaurante. De volta, fumando cigarros péssimos, nunha conversa interminábel com Jorge Amado, examinei o ambiente e informei-me. O Alcron, talvez o melhor hotel de Praga, caíu em poder do governo e é administrado por um sindicato. Mas isso non afastou dêle os antigos capitalistas. O salón estaba cheio de operários, homes de pensamento, estranxeiros que se dirixiam a Moscou, às festas do primeiro de Maio, ou vinham de lá, finda a conferência econômica. Na mesa vizinha à nossa, a delegaçón italiana fazia um barulho dos diabos. Adiante, olhos obliquos e rixos malares de asiáticos. Rostos escuros revelavam-nos xente da Índia ou da Oceania. A orquestra lançava músicas de todos os lugares. Ao fundo, alguns pares dançavam. Suxeitos bem vestidos, arredios, mulheres elegantes, criaturas ali bem visíbeis, a alguns metros, e afastadas, afastadas em excesso dos operários, dos artistas, das pessoas que iam a Moscou, voltavam de Moscou. Eram restos da clásse velha, tipos que xá non podiam ter escravos e se arruinabam em loucura furiosa, agarrados a prostitutas.
GRACILIANO RAMOS