
CONTOS DE UNHA XUVENTUDE ENLUTADA
A MINHA HISTÓRIA CNA (CAPÍTULO 6)
Finalmente, um dia, acordei em Lisboa sem ter que regressar ao CNA. Andava e nao andava. Saia de casa pela manhá e percorria a Praça do Rossio; sentia-me como se tivesse recuperado o paraíso. Comecei a fazer o que queria e desejava; comecei a arquitectar a minha vida. O temor que estava entranhado na vida tomarense, transformara-se em alegría e espírito de curiosidade plena. Comecei a comprar libros como quem compra tremoços numa feira: em saco e a peso. O cinema nao vivia sem mim. Nao passaram três meses e xá tinha a minha tertúlia instalada no Café Ribatejano. Chegaram as primeiras visitas e exposiçoes; chegou o Teatro. Chegaram os passeios em barco e em grupo a Cacilhas para beber unhas imperiais bem frescas. Nao conhecia o tédio. Foi das épocas que mais felicidade senti. O CNA estava embrulhado e guardado na prateleira da parte mais escura da minha livraria. Passei a páxina sem nenhuma classe de cerimónia. Unicamente, notava a ausência dos colegas e amigos mais próximos. Gostar-me-ia tê-los como partícipes do meu novo estar e ser na vida. Non sei se escrevi alguma vez ao Hélder F. Tive um processo de esquecimento acelerado. Passados poucos anos, quando o Victor O. se uniu, a diário, à tertúlia do Café Ribatejano, nao recordava muitas das cousas que alguma vez, esporadicamente, me mencionava. No inverno, em Dezembro, fui visitado pelo Casquinha. Senti alegria plena; fomos, quao gabarolas arvorados em machos, ao Intendente. Falamos; non deixamos de falar um segundo. Só respiramos um bocado quando sentados no bar, a beber unha cerveja, fomos abordados por duas donzelas. Ele falava-me da sua vida em Coimbra, e eu falava-lhe da minha vida em Lisboa. Ficamos de encontrar-nos. Nunca mais nos encontramos ainda que durante dois anos sabíamos um do outro e mandávamos mensagens através de um amigo comum. Cinco ou seis anos depois de sair do CNA tive como um processo de introspecçón e passei a pente fino a essência da minha vida em Tomar. Conclui que non fora tempo perdido, porque o tempo non se perde, vive-se, mas, pensei que vivi coisas e situaçoes evitáveis e desnecessárias (inclusivamente nefastas) para a minha formaçao como ser humano. Passados uns dez anos conheci um homem que vivia no castelo de Sesimbra (segundo estou informado, no castelo, fizeram uma espécie de museo ou exposiçao permanente em sua honra) chamáva-se Rafael Monteiro. Falamos do humano e do divino. Era um discípulo do mestre Agostinho da Silva (de quem me deu o número de telefone e escreveu uma cartinha para ser recebido) e amigo do António Telmo e seu grupo. Neste grupo de amigos e cúmplices estava um ex-aluno do CNA. Entao, veio á baila o colégio e a certa altura o Rafael Monteiro disse: “é um rapaz inteligente e culto, mas, tem alguma coisa inexplicável dentro. Parece-me que tu também tens um certo pouso dentro semelhante ao dele.” Nao o sabia explicar. Eu também nao o soube explicar. Hoje, ainda que nao o saiba explicar, parece-me que é uma pequena (ou grande) dor (a palabra exacta talvez seja mágoa) neurótica que levamos aninhada nas nossas vísceras. O CNA foi parte da minha vida, mas, nao é a minha vida. Thomar, com agá como gosto de escrever por uma questao mais que estéctica, é a minha terra adoptiva. E as Terras, visitam-se com carinho e periodicamente. Thomar aturar-me-á enquanto viva.
JOSÉ LUÍS MONTERO