SIGMUND FREUD (CONCLUSAO)

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               Nao há dúvida de que a nossa cultura tem uma grande dívida para com Sigmund Freud.  O nosso autor, formado em medicina numa das cidades mais formais e puritanas da Europa da viragem de século, Viena, teve a inteligência, a força e a coragem de enfrentar a verdadeira natureza humana.  Combateu fortemente aquele retrato ideal, ilusório, do ser humano, segundo o qual o homem era pouco menos que uma espécie de ser angelical, puro no fundo, e capaz de se construir livre e racionalmente.  De uma penada, o pai da psicanálise questionou o mito sacrossanto que o Occidente se esforçara por construir relativamente á natureza humana.  Como tivemos ocasiao de comprovar ao longo deste livro, segundo Freud, a razao consciente é apenas uma das instâncias que forma a psique humana, e nem sequer é a mais importante ou significativa.  Sao, sim. o obscuro inconsciente e as suas forças motoras que regem a vida humana.  Freud também teve o mérito de assinalar e analisar pacientemente outra realidade humana que a cultura e a grande tradiçao filosófica do Occidente se esforçavam por dissimular: a sexualidade.  E as suas conclusoes acabaram por ser igualmente demolidoras:  o carácter do homem adulto é, de forma muito significativa, fruto de uma luta constante, travada desde a tenra infância, entre pulsoes puramente sexuais.  Paralelamente, o ímpeto desta força sexual é capaz de determinar, mais do que certamente se está disposto a reconhecer, o dia a dia das pessoas.  Quanta coragem e amor á verdade eram necessários para sustentar estas teses no contexto da Viena finissécular!  As ideias de Freud revolucionaram sem dúvida a concepçao do homem.  Tanto assim é que nao seria exagerado afirmar que Freud marcou um antes e um depois, um ponto de inflexao, na concepçao antropológica occidental.  Mas isso nao foi tudo.  Estas teses sobre o homem acabaram por desembocar numa crua concepçao da vida em sociedade.  Se bem que tradicionalmente se tenha considerado o ser humano como um animal político que, de maneira natural e grata, accedia á vida social, Freud evidenciou, mais uma vez, a impostura desta idílica visao.  A vida em sociedade implica sempre um exercício de violência contra o indivíduo, contra os seus desejos e pulsoes mais básicas, e, por isso, a infelicidade e a frustraçao estao tao presentes nas nossas sociedades avançadas e hipertecnológicas.  A repressao das pulsoes eróticas e de tânatos do indivíduo, do seu núcleo constitutivo mais originário, é uma das consequências inevitáveis da vida em sociedade.

 

marc pepiol martí

 

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