O TEMPO E A ALMA (7) (MELGAÇO EM RIBAMINHO)

A relativa modéstia monumental de Melgaço é enganadora. O visitante dá unha volta e é tentado a contentar-se com um olhar exterior, e a seguir caminho. Os valores da arte e da paisaxem están nas imediaçóns da vila, e vale a pena dispor de duas horas para ir a Fiaes, onde a actual matriz xá foi igrexa de convento cisterciense e conserva muitos vestíxios dessa época, e túmulos com estátuas xacentes. Nunha outra pequena estrada de montanha, a cinco quilómetros, fica a igrexa de Paderne, que é tao antiga ou mais que Portugal. O nome vem, diz o povo, de Dona Paterna, viúva do conde Hermenegildo, senhor de Tui. Tudo isto foi nos inícios do século XII; o volume românico da igrexa, o duplo portal, a beleza do lugar, compensam o desvio. Castro Laboreiro, a quinze quilómetros da vila, é um local de rudeza impressionante, um mundo de força, de antiguidade e de violência petrificada. Tiveram durante muito tempo fama os caes desta rexión; a raça continua a produzir belos exemplares, mas aquí na aldeia nao é fácil encontrá-los. Dizem que aqui ou além, em quintas distantes, ainda se podem obter animais puros, mas aí está outro projecto que adio para quando o tempo o consentir: levar daqui um dos descendentes dessa raça canina. Quase às portas de Melgaço, na estrada para Monçao, atravessa-se a antiga estaçao termal. Do românico do século XII damos um salto para o galante século XIX, depois que o comboio reanimou a vida local e fez nascer as termas. Estas ainda sao das antigas, com a “buvette” no parque sob grandes arvoredos românticos, e velhos hotéis cuxos soalhos de longas tábuas oscilam sob os nossos pés. A casa de jantar, com lambris de madeira escura quase até ao meio da parede, pintados de verde-pálido, e estuque rico nos tectos, foi imaxinada para duzentos, trezentos aquistas, e parece envergonhar-se agora destes três ou quatro casais de terceira idade, que se movem com gestos póstumos e murmuram palabras em voz baixa. É sempre assim? Nao, dizem-me. Em Agosto e Setembro ainda vem muita gente. Mas sabe, agora preferem-se as praias, que sempre é outra coisa, outra vida. Que isto aqui é muito bonito; o senhor já conhece, nao conhece? Envergonho-me de dizer a verdade: conheço, mas de passagens sempre fugidias, sempre com pressa ou de chegar à fronteira, ou de me aproximar de Lisboa, e isso nao é mais que passar entre os dedos as páxinas de um livro cujo texto merece ser lido linha por linha. Este cume do Minho é das mais empolgantes paisagens que o país tem para oferecer, e non estou a falar só, nem principalmente, na paisagem física do monte e do rio, mas do mundo das pessoas, dos pequenos monumentos escondidos nos refegos das serranias, nas tradiçóns e nas ruínas, em todo o conxunto de valores morais que a terra aqui incorporou.

JOSÉ HERMANO SARAIVA E JORGE BARROS

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