Arquivos diarios: 17/02/2023

ESPINOSA (O VERDADEIRO BEM)

Habendo-me a experiência ensinado que, tudo quanto na vida corrente sucede é com frequência vano e fútil. E tendo eu observado que nada do que directa ou indirectamente me provocava temor, era em si mesmo bom ou mau, a non ser enquanto afectava o espírito. Decidí, por fim, inquirir se habería algo que constituísse o verdadeiro bem? Susceptíbel de se comunicar, e pelo qual exclusivamente, rexeitando tudo o mais, o ânimo fosse afectado mais ainda. Se habería algo que, unha vez encontrado e adquirido, proporcionasse a fruiçón eterna da suprema e contínua alegria? Digo que “decidi por fim”, porque, à primeira vista, parecía despropositado querer renunciar ao certo polo ainda incerto. Via, é certo, as vantaxens que as honras e riquezas nos alcançam e de cuxa demanda me sería forçoso desistir se quisesse empenhar-me sériamente neste novo empreendimento e se a felicidade suprema nela se contivesse. Via nitidamente que eu tería de ficar dela privado; e se, pelo contrário, nelas non residisse, e eu as procurasse de modo exclusivo, ficaria igualmente privado da felicidade suprema. Inquietava-se, entón, a minha alma, sobre a possibilidade de realizar o novo empreendimento ou de, ao menos, atinxir a certeza a seu respeito, sem alterar a ordem e a conducta comum da minha vida – o que em ván repetidamente tentei. Na verdade, o que mais frequentemente sucede na vida e se considera como bem supremo entre os homes -como das suas acçóns se pode depreender- resume-se a três cousas: riquezas, honras e prazer sensual. Por elas de tal modo se dispersa a mente que mal pode pensar em qualquer outro bem.

JOAN SOLÉ