
Antes de penetrarmos na violenta tempestade que a primeira metade do século XVII representou para a Europa, permitam-me dar três pinceladas rápidas sobre o temperamento de Descartes, tal como se depreende das suas múltiplas biografias e do testemunho das pessoas mais próximas do filósofo. Isso axudar-nos-á a contextualizar o seu “modus vivendi” e a dotar de verosimilhança alguns acontecimentos da sua vida. Em primeiro lugar, a sua aparência tinha um “encanto saturnino”. Apesar da sua pequena estatura (pouco mais de um metro e meio) e do seu aspecto pouco agraciado, tinha um ar solemne, como um cavalheiro de outros tempos: tez pálida, peruca, criados ao seu serviço, sabre militar, meias e lenço de seda, calzóns até aos xoelhos e botas com fivela de prata. Tudo isso, unido ao facto de poucos o conhecerem em pessoa, de possuir um poderoso olhar e non costumar desperdiçar palabras, contribuía para dotar a sua figura de unha aura de mistério. Em segundo lugar, tratava-se de um homem resolucto, com grande afán compectitivo e unha confiança quase cega nas suas qualidades. Face à razoável cautela destilada polos seus textos, as obxecçóns nunca o preocuparam muito. No prefácio das “Meditaçóns sobre a Filosofia Primeira” acusa os seus críticos (alguns deles velhos amigos) de serem “néscios e dúcteis”, “arrogantes” e partidários de “opinións falsas e irracionais”. Essa agressividade foi unha tónica ao longo da sua vida. Apesar de non ter chegado a combater no campo de batalha, Descartes albergou, como filósofo, muitas das virtudes próprias de um guerreiro. Finalmente, aquilo a que poderíamos chamar o seu lado “afectivo”: o carácter hipocondríaco e maníaco que o levava a ficar obcecado com a sua segurança e a sua saúde, e a pensar nunha cura definitiva contra o envelhecimento. Ao seu amigo Huygens confessou que cuidava tanto de si que pensava chegar aos cem anos, e vangloriava-se frequentemente de ter vencido, na sua xuventude, a debilidade física que o assolara desde a infância. Embora se tenha esaxerado acerca das suas dez horas diárias de sono e do seu costume de non acordar antes do meio-dia (decerto unha gabarolice), o autor das “Meditaçóns” trabalhava frequentemente na cama, xunto à lareira e era, sem dúvida algunha, pouco dado a desperdiçar esforços. A vida de Descartes costuma dividir-se em três fases totalmente diferentes: a educaçón (até aos dezoito ou vinte anos), as viaxens (impregnadas de um chamativo mistério) e a estada nos Países Baixos (que coincide com a sua eclosón intelectual e a correspondente fama como pensador). Passemos a percorrê-las brevemente, detendo-nos nos acontecimentos mais significativos de cada unha delas.
ANTONIO DOPAZO GALLEGO