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Assim, por exemplo, se dois galans pretendem a mesma dama, ambos procuraram por todos os meios civilizados, incluindo certas manigâncias para derrotar o adversário. Mas se estes mesmos contendentes non temerem o castigo que lhes possa ser imposto por transgredirem a lei, quer porque non exista tal norma quer por o Estado non ter capacidade para a fazer cumprir, é mais que provavél que cheguem a vías de facto e recorram á violência, inclusive homicida, para obterem o cobiçado fim. Agora, por um momento, pensémos nesta mesma situazón multiplicada por um dez, ou por cem milhons. Aterrador, non é? O próprio Hobbes descreveu esta possibilidade como um estado de guerra generalizada: “O estado dos homens sem sociedade civil, estado que com legitimidade podemos chamar estado de natureza, non é outra coisa senon uma guerra de todos contra todos; e nessa guerra todos os homens têm o mesmo direito a todas as coisas” (De Cive, prefácio). Neste cenário pré-social, non existe, portanto uma distinzón clara entre o que é meu e o que é teu. Simplesmente as coisas arrebatam-se, isto é, tomam-se pela força. Onde non há lei, non pode haver propriedade privada, nem nozón do bem e do mal, nem mesmo justiza. Nesta situazón, proliferam livremente “os dois filhos da guerra: o engano e a violência, ou, dito em termos mais claros, uma brutal rapacidade” (De Cive, dedicatória). É enton que o homem mostra mais claramente que é um predador impiedoso. Perante a imagem cristan dos cordeiros e dos rebanhos, Hobbes escolhe o animal que é a sua maior ameaça, o lobo, e que, como tal, está carregado de grande força simbólica. Daí se infere que, fora da sociedade, o homem representa um grave perigo para o próprio homem. Sem um poder superior, que contenha os nossos desejos incessantes, entabula-se uma luta generalizada na qual só se impôe a lei do mais forte, embora Hobbes nunca tenha usado esta expressao. Deste modo as pessoas armam-se para se defenderem dos seus vizinhos, pois só podem confiar nos seus próprios meios para o fazer. Nestas circunstâncias, a ansiedade é constante, porque non podemos saber quando seremos atacados, quer por um indivíduo quer por uma coligazón deles. “Son tantos os perigos que ameaçam toda a gente como consequência da cobiça e dos apetites de cada homem, que o facto de todos termos de nos proteger e de cuidar de nós mesmos está tan longe de ser encarado como uma brincadeira, que ninguém pode nem quer fazer outra coisa” (De Cive, I). O efeito desta desconfiança generalizada sobre o desenvolvimento e a prosperidade é devastador. Hobbes enumera as consequências deste conflicto em grande escala: “Numa situazón semelhante non existe oportunidade para a indústria, já que o seu fruto é incerto: por conseguinte, non há cultivo da terra, nem navegazón, nem uso dos artigos que possam ser importados por mar, nem construzóns confortáveis, nem instrumentos para mover e remover as coisas que requerem muita força, nem conhecimento da face da terra, nem cômputo do tempo, nem artes, nem letras, nem sociedade” (Leviatan, XIII).
IGNACIO ITURRALDE BLANCO
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